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quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Peverella admirável



Tenho um apreço especial por dois meninos enólogos que são exemplo de seriedade e dedicação: Eduardo Anghebem e Luis Henrique Zanini.
Com eles e meu velho e querido amigo Werner Schumacher formamos o grupo dos “inconformados”.
Inconformados com as decisões equivocadas que os dirigentes setoriais tomam, com os rumos da vitivinicultura brasileira, do comportamento agressivo/marqueteiro de algumas vinícolas, com a falta de seriedade que é tratada a cultura da uva, com a falta de reconhecimento dos esforços na procura da qualidade que as vinícolas familiares, pequenas, estão fazendo, com a voracidade de nossos principais sócios os governos municipais, estaduais e federal, e de muitas coisas mais que prejudicam o futuro dos que se dedicam a produzir uvas e vinhos no Brasil.

Não é por estas razões que admiro o trabalho de Eduardo e Luis, mas sim porque provei alguns de seus vinhos e sempre me chamaram a atenção pela qualidade e tipicidade. Vinhos bem feitos, sem manuseios, com caráter e sem apelos. O Pinot Noir da Anghebem e o Merlot da Vallontano são excelentes.

Durante minhas férias no Rio de janeiro, jantando no fantástico restaurante Aprazível no bairro de Santa Tereza, meu amigo Antonio Campos fez questão que provasse o Peverella Era dos Ventos produzido pela parceria entre Pedro Hermeto, proprietário do Aprazível e a Vallontano de Luis Zanini.

Devo confessar que já tinha ouvido falar deste vinho e tinha muita curiosidade em prova-lo.
Devo confessar mais uma coisa: não levava muita fé no que poderia degustar. Reconheço que por algo de preconceito da variedade Peverella que foi uma das primeiras variedades que conheci ao chegar à Serra Gaúcha em 1973. Esta variedade, hoje quase em extinção na Serra, é do centro da Itália e nunca nos empolgou.
O que provei me deixou de queijo caído.

Não é um vinho “normal”, ou seja, sua cor, seu aroma e seu sabor não são comparáveis com nenhum vinho branco dos que estamos acostumados a provar.
Por isso não é um vinho para todas as horas, com ampla capacidade de harmonização com pratos. É um vinho perfeito para ser saboreado lentamente, tal vez com algumas fatias de queijo maturado e pão caseiro.
Não sei. O que sei que nessa noite, numa mesa no Aprazível com vista à cidade do Rio de Janeiro, este vinho me deixou sem palavras por ser totalmente diferente ao que esperava.

A cor mostra a acentuada oxidação (incorporação de oxigênio) pela que passou este vinho durante a elaboração. Nós enólogos temos receio da oxidação que altera cor, aroma e sabor dos vinhos, porque geralmente ocasiona danos irreparáveis. Neste vinho, a oxidação foi tão perfeitamente conduzida que apesar da mudança intensa de cor, agora quase rosado, manteve o frescor aromático e a potencia gustativa.

É verdade que a marcante acidez, própria desta variedade, atuou como elemento protetor, mas é admirável como Zanini conseguiu “caminhar no fio da navalha” sem se cortar.
Deixa-me muito feliz comprovar quanto é possível, através de mãos dedicadas e generosas, produzir vinhos únicos, incomparáveis no Rio Grande do Sul.

Parabéns Luis Zanini pelo trabalho bem feito, parabéns Pedro Hermeto por ter acreditado e dado apoio a iniciativas tão desafiadoras.

Como seria bom que existissem muitos Pedros que apoiassem iniciativas deste tipo.

Com certeza seria mais fácil mostrar ao Brasil a capacidade que muitas cantinas pequenas, familiares, têm de elaborar produtos de qualidade.

Tal vez assim também seria possível calar a boca do personagem que a mídia “novelesca” transformou em produtor de elite e agora declara que “no Brasil se fazem vinhos muito ruins e somente há trinta vinícolas sérias (vinte e nove com a dele) ”.

sábado, 4 de janeiro de 2014

Simplesmente porque é linda



Durante uma visita de uns amigos de Belo Horizonte a nossa produtora servi um espumante na taça da figura acima. Ao fazê-lo, um dos integrantes do grupo exclamou:

“Utiliza essa taça tão bonita por alguma razão técnica?”.

Eu poderia ter dito com cara de misterioso:

“Sim , o formato destaca os aromas devido ao ângulo formado entre a base da taça e sua parte superior. Não pode ser superior a 23º”

Ou:

“Sim, a combinação do cristal com 65,3% de chumbo, a espessura do mesmo e o formato de sino invertido são vitais para destacar o volumoso perlage, os aromas intrigantes e o sabor longo e acentuado”

Ou ainda:

“Sim porque reproduz o formato de uma taça utilizada por Mme. Pompadour no século XVII no Palácio de Versailles”

Como não tenho vocação para charlatão falei:

“Sabe porque meu amigo? Simplesmente porque ela é linda”.

Se a sua taça é linda, enche os olhos e não prejudica, use sem constrangimento.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Sem novidades em 2013, infelizmente.


Como todo mundo faz, eu também vou fazer uma retrospectiva.

Sobre os vinhos e espumantes que bebi não porque foram poucos. Confesso que não sou curioso em relação aos produtos nacionais e nada curioso dos importados.
Encantei-me com os vinhos de meus amigos Eduardo Angheben e Luis Zanini e me surpreendi com alguns vinhos da Aurora. Em espumantes tenho uma queda especial pelos meus.

De resto, nada a declarar.

Vou fazer uma retrospectiva do setor vitivinícola brasileiro com meus limitados conhecimentos.

Acho que foi um ano perdido. Mais um. Se não vejamos.

Creio que a indústria vitivinícola brasileira precisa solucionar alguns velhos problemas, entraves, que dificultam que ela se desenvolva com saúde.

Carga impositiva: Nada foi feito pelas cabeças pensantes. Continuamos com a maior carga tributária do mundo que impede que O VINHO SEJA COMPETITIVO. Nacional e estrangeiro porque não se trata de aumentar a carga de um em benefício do outro como as cabeças pensantes quiseram fazer, mas tornar o vinho mais atrativo, mais barato, mais acessível.
Nosso inimigo não é o produtor concorrente, É A CERVEJA que continua sendo a bebida preferida de nove em cada dez brasileiros.
Se este entrave não for tratado de forma mais séria, talvez pelos caminhos políticos adequados, continuaremos consumindo menos de DOIS LITROS POR ANO.

Conseguir que os mini e pequenos produtores sejam incorporados ao SIMPLES NACIONAL é uma questão de justiça e conseguirá alavancar o crescimento (e subsistência) destes que agregam mais valor cultural ao vinho e fazem algumas maravilhas.

Divulgação: Estive recentemente em Mendoza e conversei com José Alberto Zuccardi, produtor desta famosa marca e uma das cabeças mais lúcidas da Argentina.
Queixava-se da indiferença das lideranças brasileiras em relação a estudar esforços comuns para a divulgação institucional do VINHO.
Os produtores argentinos, segundos em volume de exportação para o Brasil, estão interessados em aumentar o mercado e o consumo per capita. Com certeza Chile aceitaria também participar aumentando substancialmente o volume de recursos.

Que preferem as cabeças pensantes do Brasil? Gastar uma boa grana nas escolas de samba, em campanha publicitária concentrada no Rio Grande do Sul, onde mais se consome vinho nacional, e fazer ações no canal direto onde geralmente brilham os quatro ou cinco grandes produtores. Cheguei ao Brasil em janeiro de 1973 quando eram consumidos menos de dois litros. Quarenta e um anos depois se consome o mesmo volume.

Como a divulgação inteligente não é feita corre solto o MARKETING LEVIANO, MENTIROSO E PREDADOR.

Burrocracia: Os importadores sofrem, o produtor nacional sofre, todo mundo sofre a lentidão e ineficiência da máquina pública à serviço do setor.
As cabeças pensantes tiveram uma ideia brilhante: solicitaram e ganharam, teoricamente para combater o contrabando de “trocentos” milhões de garrafas, o uso obrigatório do SELO FISCAL.

Desafio, e coloco meu blog a disposição para publicar, que me provem qual o volume de contrabando que esta medida consegui diminuir.

Algumas normas recentes tratam as cantinas como verdadeiras UTIs, SALAS DE CIRURGIA. A higiene é fundamental e indiscutível mas transformar cantinas rurais, simples, modestas, feitas com muito esforço, em pequenas usinas de leite é exagero.

Entra o azulejo, a cerâmica, a placa de alerta, o álcool gel e sai o aconchego, o calor humano, o cheiro de cantina. Acabemos com isso em 2014!!!

Falta de regras para produzir: A Lei Brasileira de Vinhos foi e é uma das mais omissas do mundo. Classifica vinhos de mesa e viníferas, espumantes de modo geral sem detalhar os métodos, prazos, ciclos, etc,

Continuamos com a chaptalização correndo solta, pouco estímulo a uvas maduras e o que é pior, com a nefasta POLITICA DE PREÇOS MÍNIMOS que impede a livre negociação e maior valorização da matéria prima.

É necessária uma atualização urgente da legislação mas em 2013 nada se fez.

Falta de união: Continua sendo uma das características predominante do setor.

As principais regiões produtoras do mundo, na França, Itália, Espanha e outras, se ergueram e organizaram, descobriram que nada conseguiriam desunidos após as guerras que destruíram vinhedos e construções. Aqui a guerra que sofremos é diária, de uns contra outros. Será que 2014 é o ano?

Acho que minha retrospectiva ficou mais como um desabafo. Tenho a sensação de estar ligeiramente mais leve.

DESEJO QUE 2014 SEJA UM ANO NO QUAL UM (QUEM SABE TODOS!!!) DOS ITENS RELACIONADOS ACIMA SEJA TRABALHADO ATRAVÉS DA PARTICIPAÇÃO DE TODOS OS PRODUTORES, PEQUENOS, MÉDIOS E GRANDES, COOPERATIVAS E EMPRESAS PARTICULARES.