domingo, 20 de janeiro de 2013

ORUS, o embaixador


O espumante ORUS do qual produzo algo em torno de 600 garrafas anuais tem uma importância especial para mim já que o considero o “embaixador da Adolfo Lona”.

Quando comento que eu consumo quase metade das garrafas as pessoas sorriem desconfiadas porque pensam que é um piada. Não é. É verdade que não conto quantas bebo, mas uma das coisas que me dá mais prazer é compartir uma garrafa de Orus com visitantes e amigos.

É tanto o orgulho que tenho de sua qualidade e a confiança do prazer que proporciona ao bebê-lo, que deixa de ser importante a parte comercial e ganha força o momento que vivo ao comparti-lo.

Não é raro oferecer uma taça de Orus a visitantes especiais, que assim os considero não por sua capacidade de compra, mas pelo interesse e persistência que mostraram ao chegar a nossa minúscula produtora, quase escondida num bairro de Garibaldi, com o objetivo de conhecer nosso trabalho.

Com meus amigos o considero quase obrigatório, talvez até com certa dose de egoísmo. Eles ficam felizes quando conhecem o Orus, eu fico feliz de compartir o momento com eles.

Alguns críticos o consideram o melhor produzido até hoje no Brasil, outros o colocam entre os melhores, outros nem o consideram. É a magnífica controvérsia própria do mundo do vinho e dos espumantes onde a subjetividade corre solta.

Eu o considero parte importantíssima de meu portfólio de produtos que sempre procurei fosse formado por espumantes diferentes, dignos, com estilo próprio, de ser possível inconfundíveis, independentemente do método de elaboração.

Virão novos produtos sob esse critério de produção? Certamente sim e em breve, mas dificilmente algum tirará o título de embaixador ao ORUS. Ele merece.





quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

O momento do enólogo



Apesar de acompanhar a evolução dos vinhos em cantina e todos os movimentos na preparação dos mesmos para o engarrafamento durante o ano todo, há um momento no qual todos nós enólogos ficamos algo apreensivos e na expectativa de como irá evolucionar o fim do ciclo da maturação das uvas, o momento da colheita e o inicio da elaboração dos vinhos novos.
O comportamento do tempo, em especial as chuvas fortes e intercaladas com dias ensolarados, tiram nosso sono porque constituem uma variável da qualidade das uvas. Além de impedir a maturação estimulam a presença de fungos que provocam a podridão e nestes casos não conseguimos decidir pelo melhor e sim pelo menos pior.
Este ano o clima seco antecipou a maturação e permite que se aguarde com tranquilidade o momento da colheita, considerando que as uvas destinadas a espumantes devem ter moderada quantidade de açúcares e uma boa acidez. Ou seja, devem ser colhidas um pouco antes da maturação total. No caso das uvas brancas o clima seco também contribui para garantir perfeito estado sanitário das mesmas evitando a formação de componentes precursores da oxidação que alteram a cor e os aromas dos vinhos.
No caso dos vinhos tintos a total maturação das uvas e a sanidade são fatores fundamentais na procura de produtos de alta qualidade. Elaborar vinhos que desafiam o tempo requer matéria prima adequada, algo de tecnologia e enólogos pacientes. Até o momento, o clima parece estar contribuindo para a perfeita maturação das uvas tintas e isso é tranquilizador.
Tudo parece fácil nesta situação mas é importante lembrar que a transformação dos açúcares da uva em álcool e centenas de outros componentes através da fermentação alcoólica é um fenômeno microbiológico e por isso todo o cuidado é pouco. Higiene e controle de temperatura de fermentação são fatores determinantes da presença ou ausência de microrganismos indesejados, em especial bactérias.
O mais fantástico da elaboração dos vinhos novos é porque é um desafio que se renova a cada ano. Nós enólogos temos a oportunidade de aprimorar nossas técnicas a cada ano desde que saibamos aprender com os erros ou desacertos cometidos no ano anterior. Os pequenos ajustes que aprimoram nossa experiência constantemente possibilitam agir com segurança interpretando o potencial de cada uva, de cada região, todos os anos.
O professor Francisco Oreglia, sacerdote salesiano e diretor da Escola de Enologia de Mendoza na Argentina onde me formei nos lembrava que enologia é a arte e a ciência da elaboração de vinhos e espumantes: arte, porque os enólogos somos simples condutores de um fenômeno natural através do qual a uva se transforma num produto que é reflexo de sua expressão. O enólogo não tem de interferir, não tem de desviar ou alterar a manifestação da natureza. O uso de técnicas ou insumos que alterem a composição do suco ou as características organolépticas do vinho é a prática da enologia intervencionista, da má enologia, a que desfigura o que faz parte do patrimônio cultural das regiões produtoras. Deve ser respeitado por todos nós.