Estou iniciando o blog "VINHO SEM FRESCURAS" justamente porque estou cansado de tanta frescura quando o tema é vinho. Pretendo abordar todos os assuntos relacionados a esta bebida tão natural da forma mas simples possível. Participe enviando noticias, comentários, críticas ou elogios sobre vinhos, espumantes nacionais ou estrangeiros e até, se quiser, sobre algúm de meus espumantes ou vinho que elaboro na pequena e simpática cidade de Garibaldi no interior de Rio Grande do Sul.
quarta-feira, 18 de março de 2015
O apaixonante e complicado negócio do vinho
Somente os que produzem uvas e vinhos sabem a realidade do negócio.
Os produtores mais antigos são mais cautelosos, conservadores porque os calos em suas mãos não surgiram por acaso.
Os novos investidores, movidos pelo entusiasmo e ânsia de participar do mundo da uva e do vinho, são mais audazes apesar de as vezes possuírem conhecimentos limitados do negocio com um todo.
Porque quem deseja produzir vinhos a partir de vinhedos próprios para comercializa-los no mercado interno ou exporta-los, precisa entender que cada uma das variáveis, uva-vinho-comercialização, estão intimamente ligadas e não funcionam separadas ou desconectadas.
A realidade é que a vitivinicultura é movida pela paixão, mas impulsionada pela técnica, pelo conhecimento, pela experiência.
A viticultura representada pelas figuras simétricas que formam um manto verde, enche os olhos despertando emoções mas esconde um desafio monumental que exige paciência, esforço e tempo para vence-lo. Os grandes vinhos não surgem por acaso. São resultantes de uvas bem tratadas, maduras, sadias, perfeitas para o tipo de vinho aos qual se destinam.
A videira é uma trepadeira que cresce em qualquer cantinho de terra mas não se engane: ela gosta de sol, de frio, de luz, de água mas é sensível aos excessos ou falta de qualquer um deles.
Não gosta nem precisa de alimentos em excesso, prefere a austeridade, a pedra, o calcário.
É delicada, vulnerável, sensível. Ao menor descuido fica doente, fraca, não consegue produzir bem.
Um detalhe: cada variedade é diferente da outra e por isso saber cultivar uma não significa entender de todas. Conhecer um pouco de viticultura então, exige anos de experiência, de atenção, de humildade e em especial de paciência, todo erro de hoje pode-se corrigir amanhã.
A vinicultura representada pela penumbra das caves onde repousam as barricas num ambiente absurdamente envolvente e romântico, também esconde desafios gigantescos que iniciam na postura produtiva: a de curto prazo onde as técnicas modernas como o uso de chips e equipamentos como osmose inversa, micro oxigenação e outros substituem o tempo e possibilitam vinhos mais padronizados ou a tradicional onde a procura da tipicidade não tem prazo mas tem fim: vinhos únicos, com caráter.
Dar-se-á melhor aquele que não forçar a natureza: cada região tem condições naturais para produzir melhor, um determinado tipo de vinho. Para dar um exemplo cito a Cabernet Sauvignon, uva que apesar de ter um apelo comercial importante, não é a mais adequada para a maioria das regiões brasileiras.
Após implantado o vinhedo, construída a cantina e elaborados os vinhos dá inicio a etapa mais difícil e complicada: a comercialização.
A oferta de vinhos no mercado interno é tão variável e a presença dos importados tão importante que somente produtos de alta qualidade e preços competitivos tem alguma chance. Mas não basta ter o produto, é necessário criar uma rede de distribuição que possibilite chegar aos consumidores da maior número possível de praças, com agilidade.
Definir o posicionamento de preço de cada produto e mantê-lo é outro desafio. É necessário decidir em que prateleira queremos ver nossos produtos: na de baixo preço onde as grandes vinícolas nacionais e estrangeiras brigam geralmente em supermercados, na de preços intermediários em lojas especializadas, mas seletiva e segura ou na de preços altos onde competem importados de prestigio e dão pouco resultado desde o ponto de vista de volume?
Parece pouco? Pense na gigantesca, injusta e inútil carga tributária que penaliza todos com pagamento de altos impostos antecipadamente. Você financia os governos.
Se ainda assim você insiste em permanecer produzindo, seja bem vindo ao apaixonante, romântico, envolvente, complicadíssimo e estressante mundo da vitivinicultura.
quarta-feira, 4 de março de 2015
A ave da PAZ
Quando cheguei ao Brasil em 1973, um técnico do Ministério da Agricultura disse para mim que a qualidade das uvas viníferas estava ameaçada pelos frangos.
Não entendi o porque dessa associação entre frango e qualidade das uvas até conhecer melhor os sistemas de produção de uvas na Serra.
Nos principais municípios produtores de uvas finas a criação de frangos para corte era um médio de vida para muitas famílias. Isto fazia com que a oferta da chamada “cama de aviário” fosse farta.
Alguns produtores de uva adquiriam a baixos preços este esterco de galinha e o agregavam a seus vinhedos. Este adubo provocava a explosão do sistema vegetativo e as videiras se transformavam em verdadeiras trepadeiras com uma produtividade digna do Livro dos Recordes.
O excesso de folhagem e produtividade empobrecia as plantas resultando em uvas pouco maduras, com poucos teores de açúcares.
O técnico tinha razão ao relacionar a baixa qualidade das uvas com os frangos.
Agora, em especial na região da Campanha Gaúcha onde as culturas extensivas de arroz, soja e milho abrem espaço para empreendimentos vitivinícolas, uma ave que é símbolo de paz esta tirando o sono e a produção de forma muito preocupante.
As pombas estão consumindo uma parte importante das uvas maduras, quase prontas para serem colhidas.
Não há dados concretos sobre a perda mas me arriscaria a disser que pelo menos 25% das uvas são perdidas. A foto que ilustra este artigo mostra o tamanho do estrago.
Porque este tipo de flagelo não acontece em outras regiões? Justamente pela estrutura produtiva da Campanha onde o alimento como arroz e milho atrai estas aves. Ao chegar a região e propagar-se ganham população e atacam ferozmente as uvas doces, tentadoras.
Acredito que algumas medidas preventivas deverão ser tomadas pelos produtores sob risco de continuar tendo perdas importantes.
Não vejo muitas alternativas fora as telas protetoras que podem resultar caras, algo próximo de 6 mil reais por hectare, mas cálculos simples demonstram que numa ou duas safras o investimento é amortizado.
Assim como em Mendoza na Argentina o risco do granizo obriga a incluir nos custos de implantação a tela anti-granizo, na Campanha deverá ser incluída a tela “anti-pássaros”.
Doe a primeira vez, mas depois passa.